Quando a violência de gênero se disfarça: campanha da
Save the Children reflete as realidades sombrias enfrentadas por meninas no
México e no Brasil.
No México e no Brasil, a violência de gênero atinge níveis alarmantes, e campanhas como essa são necessárias para dar voz às mulheres silenciadas.
"A compra do silêncio também é um crime." Essa poderia ser a linha de abertura de qualquer campanha séria que alerta contra a violência. Mas no mais recente filme da Save the Children, a realidade vai além do silêncio, tocando na dor profunda que mulheres e meninas enfrentam diariamente.
Dirigida por Laura Baumeister e com criação da agência Anónimo, a campanha explora uma questão cruel: no México, 10 mulheres são assassinadas todos os dias. A solução desesperada encontrada por uma mãe para proteger sua filha? Disfarçar sua identidade de gênero.
No filme, a pequena Fer circula pelas ruas de sua cidade, testemunhando a violência constante que os homens infligem às mulheres ao seu redor. Mas enquanto ela veste a aparência andrógina que sua mãe cuidadosamente preparou — cabelo curto e roupas de menino —, Fer se mantém a salvo das agressões.
O disfarce é a proteção em um mundo onde ser menina é um risco. A peça toca fundo em uma ferida estrutural: 70% das mulheres mexicanas com mais de 15 anos já sofreram violência pelo menos uma vez em suas vidas, segundo o Instituto Nacional de Estatística e Geografia do México (INEGI).
E no Brasil?
Agora, como não ver o espelho da dor mexicana refletido em terras brasileiras? Enquanto o México tenta enfrentar essa dura realidade, o Brasil infelizmente carrega o título de país que mais mata pessoas LGBTQIAP+ e trans no mundo, além de registrar altos índices de violência contra mulheres. E a brutalidade não para por aí. Somente 24% das mulheres no Brasil conhecem a Lei Maria da Penha, uma legislação que, apesar de ser um marco no combate à violência doméstica e já existir há 18 anos, ainda enfrenta resistência e desinformação, como reportado pelo ICL Notícias .
Essa mesma lei, que nasceu da trágica história de Maria da Penha, é constantemente atacada por grupos conservadores que tentam distorcer sua narrativa e enfraquecer suas bases, conforme apontado em artigos de ICL Notícias. Em um contexto onde a violência contra as mulheres é constantemente encoberta e ignorada, campanhas como essa são fundamentais para expor a realidade.
Brasil e a campanha "Meu Primeiro Sutiã": Uma Releitura Poderosa
Assim como no México, o Brasil também viu recentemente uma iniciativa impactante com a nova versão do clássico comercial "Meu Primeiro Sutiã". Esse icônico comercial, originalmente criado por Washington Olivetto para a Valisère, foi adaptado pela Madre Mia Filmes em parceria com a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais).
A versão atual toca em uma questão urgente: a conscientização sobre a violência e o preconceito contra pessoas trans, especialmente crianças e adolescentes em seus próprios lares. O vídeo mostra, com sensibilidade, como a primeira experiência de transição pode ser vivida com medo e violência, um retrato profundo da dor que muitas meninas e meninos trans enfrentam diariamente em ambientes que deveriam ser de proteção.
Quem está por trás da campanha?
A criação é da agência Anónimo, reconhecida por suas campanhas sociais de impacto, e a produção é assinada pela Save the Children, uma das ONGs mais respeitadas no mundo, conhecida por sua atuação em defesa dos direitos das crianças. Julieta de la Fuente, diretora de serviços ao cliente da Anónimo, declarou que o objetivo da campanha é "abrir os olhos da sociedade e enfatizar a necessidade urgente de proteger meninas e mulheres". Ivonne Piedras, da Save the Children, destacou que as meninas e adolescentes no México "enfrentam uma violência significativa que infringe seus direitos mais básicos" .
O impacto além das telas
A campanha, que já é considerada uma peça de grande potencial em festivais de cinema, não termina no vídeo. A Save the Children está divulgando um dossiê com ações concretas para combater a violência contra meninas e mulheres no México. Essa ação se desdobra também em uma campanha impressa que visa continuar levantando a bandeira da proteção feminina.
No Brasil, a recriação de "Meu Primeiro Sutiã" pela ANTRA também mostra que a publicidade pode ser uma força poderosa para levantar vozes que, historicamente, têm sido silenciadas. A diferença é que, ao invés de esconder as vítimas, as campanhas estão tirando-as da sombra, chamando atenção para a violência intrafamiliar e a intolerância que ainda impera na sociedade.
E como no Brasil?
Será que se disfarçar de outro gênero aqui salvaria as meninas e adolescentes da violência brutal que enfrentam nas ruas? A verdade é que o Brasil não precisa de disfarces, mas sim de políticas públicas eficientes que protejam suas mulheres e meninas sem a necessidade de subterfúgios desesperados. Campanhas como a da Save the Children e o trabalho da ANTRA são exemplos de que a publicidade pode ser mais do que entretenimento: ela pode ser uma ferramenta de transformação social.
Referências:
• Campaign Live: [ https://www.campaignlive.com/article/young-girl-disguises-gender-highlight-violence-issue-mexico/1891825 ]
• G1 - Violência de Gênero no Brasil: [ https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2024/noticia/2024/10/07/mpf-acompanha-11-casos-de-violencia-politica-de-genero-nas-eleicoes-municipais-inclusive-de-agressoes-fisica-e-sexual.ghtml ]
• Save the Children: [ https://www.savethechildren.net/ ]
• ICL Notícias - Lei Maria da Penha desconhecida por 24% das mulheres
• ICL Notícias - Extrema direita e ataques à lei Maria da Penha
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